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Dia Nacional da Conservação do Solo: desafios e soluções para preservar um recurso vital

Dia Nacional da Conservação do Solo: desafios e soluções para preservar um recurso vital

Publicado 4/15/2025, 2:12:19 PM, última modificação 4/15/2025, 4:43:01 PM
Em comemoração à data celebrada hoje (15), professores da UTFPR da área de solos falam sobre seus últimos estudos.

No dia 15 de abril comemora-se o Dia Nacional da Conservação do Solo, uma data criada para alertar sobre a importância dos solos e os perigos da sua degradação. A seguir, apresentamos uma reportagem especial com os professores da ciência do solo da UTFPR que trazem dados que destacam a situação dos solos no mundo e no Paraná, os riscos da erosão e as melhores práticas para cuidar desse recurso fundamental.

Você sabia?

Os solos sustentam a produção de alimentos, a disponibilidade de água e grande parte da biodiversidade terrestre. Contudo, a FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) alerta para um quadro preocupante de degradação do solo em escala global. Confira alguns fatos destacados:

  • Um terço dos solos do mundo está degradado: cerca de 33% dos solos globais já perderam parte de sua capacidade de suportar funções essenciais (produção de alimentos, regulação da água, suporte à biodiversidade) devido à erosão, salinização, compactação, acidificação e contaminação​. Solos degradados capturam menos carbono atmosférico, contribuindo para as mudanças climáticas;
  • Perda de biodiversidade no solo: os solos abrigam aproximadamente 1/4 de toda a biodiversidade do planeta, incluindo milhões de organismos fundamentais aos ecossistemas. A degradação coloca em risco essa vida subterrânea, estima-se que 20–30% das terras do mundo estejam degradadas, o que reduz habitats de espécies benéficas e serviços ambientais essenciais​;
  • Erosão hídrica acelerada: a erosão causada pela água é o principal tipo de degradação do solo globalmente​. A FAO calcula que a cada ano são perdidas de 25 a 40 bilhões de toneladas de solo fértil pela erosão, reduzindo drasticamente a produtividade agrícola e a capacidade do solo de armazenar água e nutrientes​. Em termos práticos, a cada 5 segundos perde-se no mundo uma área de solo equivalente a um campo de futebol​;
  • Perda de carbono orgânico: a matéria orgânica do solo (carbono orgânico) é crucial para a fertilidade e para a regulação do clima. Com práticas inadequadas, muitos solos agrícolas já perderam 30% a 75% do carbono originalmente estocado, liberando CO₂ para a atmosfera​. A degradação do solo diminui seu papel como sumidouro de carbono e agrava o efeito estufa;
  • Compactação e contaminação: o uso de máquinas pesadas e o pisoteio excessivo podem compactar o solo, reduzindo sua porosidade e infiltração de água. Já a contaminação por resíduos industriais, metais pesados ou uso inadequado de agrotóxicos polui os solos e pode torná-los improdutivos ou perigosos à saúde. Em muitas regiões, inclusive no Brasil, solos sofrem também com poluição e salinização associadas a manejos incorretos​;

Esses dados evidenciam a urgência de conservar os solos. Estima-se que cerca de 3,2 bilhões de pessoas no mundo são afetadas pela degradação do solo​, o que torna a segurança alimentar e hídrica um desafio crescente. Proteger o solo significa garantir um futuro sustentável em termos de comida, água e equilíbrio ambiental.

O solo no Paraná

No estado do Paraná, a situação dos solos merece destaque especial. Resultados do projeto MapBiomas Solo, coordenado pela professora Taciara Zborowski Horst (UTFPR Dois Vizinhos) e professor Alessandro Samuel Rosa (UTFPR Santa Helena), vêm revelando características importantes dos solos paranaenses. De acordo com esse mapeamento de alta resolução, predominam no Paraná os solos de textura argilosa e muito argilosa​. Solos argilosos são aqueles com alto teor de argila, o que geralmente lhes confere maior fertilidade e capacidade de retenção de água e nutrientes. Esse predomínio de texturas finas diferencia o Paraná de regiões como o Cerrado, onde há mais solos arenosos.

Outro dado importante apresentado pelo MapBiomas Solo diz respeito aos estoques de carbono orgânico nos solos do estado. Graças ao alto teor de argila e ao histórico natural (antigas florestas subtropicais), os solos paranaenses apresentam elevados teores de matéria orgânica, entre os mais altos do país. Em média, os solos do bioma Mata Atlântica (que abrange a maior parte do Paraná) armazenam cerca de 50 toneladas de carbono por hectare nos primeiros 30 cm – valor superior ao da maioria dos demais biomas brasileiros​. Isso indica um potencial significativo dos solos do Paraná em termos de fertilidade e serviço ecossistêmico de sequestro de carbono.

No entanto, há um ponto de atenção: grande parte desse carbono está concentrada na camada superficial (0–30 cm) do solo, justamente a mais impactada pelas práticas agrícolas. Ou seja, os estoques de matéria orgânica dos solos paranaenses são vulneráveis se o manejo da terra não for adequado. A conversão de áreas nativas para agricultura ao longo das décadas já resultou em perdas notáveis de carbono do solo – um fenômeno observado nacionalmente e também possível aqui. Por exemplo, práticas agrícolas convencionais (com aragem intensiva e pouca cobertura do solo) podem liberar uma parcela substancial do carbono armazenado, reduzindo a qualidade do solo e contribuindo para emissões de CO₂​. Além disso, o uso intensivo da terra no Estado – com cultivos anuais sucessivos, preparo do solo e tráfego de máquinas – exige cuidado redobrado para evitar degradação. O Paraná é um dos líderes agrícolas do Brasil, com alta produtividade em grãos, pecuária e outros setores, o que significa que os solos estão sob uso constante. Esse cenário reforça a importância de adotar práticas conservacionistas, pois a pressão sobre o solo é grande e qualquer manejo inadequado pode rapidamente resultar em erosão, perda de nutrientes e declínio da produtividade.

Em suma, o Paraná dispõe de solos naturalmente férteis e ricos em carbono, um patrimônio que deve ser manejado de forma sustentável. Conhecer a distribuição dos tipos de solo e seus estoques de carbono (como proporcionado pelo MapBiomas Solo) ajuda a orientar políticas e práticas agrícolas que conciliem a alta produtividade com a conservação do solo para as futuras gerações.

Risco de erosão hídrica

A erosão hídrica (causada pela água da chuva escorrendo sobre a superfície) é historicamente um dos maiores desafios para a conservação do solo no Paraná. O estado possui relevo variado, com muitas áreas de declive, e chuvas abundantes em grande parte do ano. Se o solo estiver desprotegido – sem cobertura vegetal, sem práticas conservacionistas – as enxurradas podem carregar a camada fértil embora, abrindo sulcos e voçorocas e empobrecendo drasticamente a terra. Eventos de chuva extrema, que tendem a se tornar mais frequentes com as mudanças climáticas, agravam ainda mais esse risco. Chuvas torrenciais concentradas em poucas horas podem causar em um único dia uma perda de solo que levaria anos para se formar novamente, especialmente em áreas de lavoura mal manejadas ou pastagens degradadas.

Uma voçoroca (erosão profunda) no município de São Roque de Minas, MG, exemplifica o estágio extremo da erosão do solo, resultante de anos de manejo inadequado e chuvas intensas. Fenômenos assim começam com pequenos sulcos e, se não controlados, evoluem para crateras que inviabilizam o uso agrícola da área e causam assoreamento de rios.

Estudos recentes coordenados pelo professor André Pellegrini (UTFPR Dois Vizinhos) têm quantificado, com dados de campo, as perdas de solo por erosão hídrica no Paraná e a efetividade de práticas de contenção. A Rede Paranaense de Agropesquisa em Solo e Água instalou megaparcelas experimentais em diversas regiões do estado para medir a erosão sob diferentes manejos e intensidades de chuva. Os resultados preliminares são reveladores: em um evento de chuva extrema ocorrido em Dois Vizinhos (Sudoeste do PR) – cerca de 68 mm em poucas horas, no dia 30/05/2019 – uma área de plantio sem terraceamento registrou um escoamento superficial de água de aproximadamente 40 litros por segundo, enquanto outra parcela com terraços nas mesmas condições teve escoamento de apenas 6 L/s​. Essa diferença dramática refletiu-se na quantidade de solo perdido: estimou-se a perda de 305 kg de solo na área sem terraços contra apenas 27 kg na área terraciada​. Em outras palavras, os terraços reduziram em mais de 90% a erosão durante uma chuva forte.

Esse experimento ilustra o alto risco de erosão hídrica em cenários de chuva intensa quando o solo não está adequadamente manejado. Áreas sem práticas conservacionistas, sobretudo em encostas e terrenos inclinados, ficam vulneráveis a enxurradas que removem a parte mais produtiva do solo (rico em matéria orgânica e nutrientes). Com o aumento da frequência de eventos climáticos extremos, como tempestades intensas em curtos períodos, tais perdas tendem a se agravar caso nada seja feito. Os pesquisadores destacam que, ao longo do tempo, coletar esses dados ajudará a definir critérios técnicos mais precisos (por exemplo, espaçamento ideal entre terraços, necessidade de culturas de cobertura, etc.) para cada situação​. Também fica evidente a importância de combinar medidas: cobertura do solo, manejo da matéria orgânica e estruturas físicas de contenção atuam juntas para minimizar a erosão. Sem esses cuidados, além do prejuízo na lavoura (pela perda de fertilidade e necessidade de mais insumos para compensar), a erosão causa impactos ambientais sérios, como o assoreamento de rios, enchentes e deslizamentos.

Felizmente, a mesma pesquisa mostrou que boas práticas agrícolas podem conter a erosão mesmo sob chuva forte. A adoção de plantio direto, cobertura permanente do solo e terraceamento, por exemplo, tem se mostrado eficaz para manter a água infiltrando no terreno ao invés de escoar superfície abaixo​. Assim, proteger o solo contra a erosão hídrica não é apenas possível, mas traz ganhos econômicos (conservando fertilidade) e ambientais (água limpa, estabilidade de encostas). A seguir, veremos algumas dessas práticas de conservação do solo em detalhe.

Como cuidar do solo

Diante de tantos desafios, quais são as soluções? A boa notícia é que existem práticas agrícolas conservacionistas que permitem produzir de forma sustentável, mantendo o solo saudável para hoje e para o futuro. O professor Paulo Cesar Conceição (UTFPR Dois Vizinhos) destaca algumas das principais estratégias de manejo para cuidar do solo e evitar a degradação:

  • Rotação de culturas: consiste em alternar diferentes culturas na mesma área ao longo das safras (por exemplo, soja no verão seguida de trigo no inverno, ou milho seguido de braquiária). Essa prática quebra ciclos de pragas e doenças, reduzindo a necessidade de agrotóxicos, e previne a exaustão do solo que ocorre em monocultivos contínuos​. Cada espécie retira e devolve nutrientes de forma distinta; com rotação bem planejada, o solo descansa de certas exigências e recupera outras. Além disso, culturas com raízes diferentes exploram camadas variadas do solo, melhorando sua estrutura. Resultado: um solo mais equilibrado, biodiverso e produtivo no longo prazo.
  • Plantio direto: é um sistema de cultivo sem revolvimento do solo (ou com revolvimento mínimo). Em vez de arar e gradear, o agricultor semeia diretamente sobre os restos da cultura anterior, que permanecem como palhada cobrindo o solo. O Sistema Plantio Direto (SPD) se baseia em três pilares: mínimo preparo do solo, cobertura permanente e rotação de culturas​. Ao não revirar a terra, mantêm-se os poros e agregados do solo, reduzindo a erosão e a compactação. A palhada protege contra o impacto das gotas de chuva e a variação de temperatura, além de servir de alimento para organismos do solo. Com o tempo, o plantio direto aumenta a matéria orgânica e melhora a infiltração de água, diminuindo enxurradas. Estudos mostram que o SPD bem manejado pode praticamente eliminar a erosão em comparação ao sistema convencional arado​. Outra vantagem é a economia de combustível e maquinaria, tornando a prática não apenas conservacionista, mas também rentável.
  • Terraceamento: consiste em construir terraços ou curtos degraus ao longo do terreno em nível, especialmente em áreas de encosta. Os terraços funcionam como barreiras físicas que diminuem a velocidade da água da chuva ladeira abaixo, forçando sua infiltração. No Paraná, o terraceamento é tradicional no combate à erosão e vem se mostrando fundamental para aguentar eventos de chuva extrema. Como vimos, em áreas com terraços a enxurrada pode ser reduzida a frações da observada em áreas sem essa estrutura​. O terraceamento adequado, aliado ao plantio direto, praticamente impede a formação de voçorocas e ravinas. Além de conservar o solo no local, essa prática evita assoreamento de cursos d'água e protege infraestrutura (estradas, pontes) dos estragos causados por correntes de lama. É importante projetar e manter os terraços corretamente (respeitando declividade, espaçamento, desnível), mas os benefícios em termos de controle da erosãoe conservação da água no solo compensam o investimento.
  • Culturas de cobertura: são plantas semeadas não para a colheita comercial, mas sim para proteger e melhorar o solo. Exemplos incluem mucuna, nabo forrageiro, aveia, crotalária, entre outras, geralmente cultivadas no intervalo entre culturas principais ou em consórcio. As coberturas vegetais mantêm o solo sempre coberto por verde ou palha, suprimindo ervas daninhas e evitando solo exposto. Elas também incorporam matéria orgânica ao solo através de suas raízes e da palhada que deixam quando morrem ou são manejadas​. Muitas são legumes que fixam nitrogênio do ar, fertilizando naturalmente a terra. Com cobertura viva, a chuva encontra um colchão vegetal que amortece seu impacto – isso pode reduzir em até quase 100% a energia erosiva das gotas de chuva sobre o solo descoberto​. Essas plantas de cobertura atuam, portanto, como aliadas silenciosas: melhoram a estrutura do solo, aumentam a infiltração de água, alimentam a microbiota benéfica e disponibilizam nutrientes para a safra seguinte. Tudo isso se traduz em menor necessidade de corretivos e maior estabilidade produtiva.
  • Manejo sustentável da matéria orgânica: matéria orgânica é sinônimo de vida e fertilidade no solo. Cuidar do solo implica manter e aumentar seu teor de matéria orgânica. Isso se consegue por meio de várias ações: devolver os resíduos de colheita ao campo (em vez de queimar ou remover), adicionar adubos orgânicos (esterco, composto), fazer plantio direto com rotação e cobertura, e evitar ao máximo deixar solo nu. Um solo rico em matéria orgânica tem melhor estrutura (agregados estáveis), retém mais água e nutrientes, e sustenta uma biologia de solo ativa (microrganismos, minhocas, etc.). Essas condições levam a menos compactação, maior infiltração de água, menor perda de nutrientes e maior atividade biológica, culminando em produtividade mais elevada e sustentável. Em resumo, cada porcento a mais de matéria orgânica no solo é um ganho enorme: significa carbono retirado da atmosfera e armazenado no solo, solo mais fértil e resiliente, e menor dependência de insumos externos. O produtor que adota esse manejo observa, no longo prazo, solos “vivos” que respondem melhor às adversidades climáticas e requerem menos intervenções corretivas.

Em conjunto, essas práticas conservacionistas formam um pacote de manejo sustentável do solo. Quando bem aplicadas, elas se reforçam mutuamente: a rotação diversifica a cobertura, o plantio direto mantém a palhada, a cultura de cobertura enriquece a matéria orgânica, os terraços controlam a água superficial. Os benefícios vão desde a redução da erosão e aumento da fertilidade, até maior estabilidade de produtividade e menores custos com insumos. Para a sociedade em geral, solos bem cuidados significam rios mais limpos, menos enchentes, maior segurança alimentar e mitigação das mudanças climáticas (via carbono retido no solo).

Para pensar…

No Dia Nacional da Conservação do Solo, a mensagem que fica é de alerta e ação. Os dados mostram que já perdemos muito solo por mau uso, mas também indicam os caminhos para a recuperação e conservação. No mundo, 1/3 dos solos está degradado​ – mas isso não precisa avançar mais se adotarmos práticas inteligentes agora. No Paraná, temos solos ricos que precisam ser mantidos assim através da ciência e do cuidado no dia a dia do campo. Produtores rurais, comunidade acadêmica e formuladores de políticas devem atuar juntos para promover a conservação do solo, pois dela dependem a água que bebemos, os alimentos que consumimos e o equilíbrio ambiental que sustenta a vida. Cada ação conta: seja construir um terraço na lavoura, diversificar culturas ou apoiar projetos de mapeamento e educação, tudo converge para garantir que nossos solos continuem produtivos e vivos. Em última instância, conservar o solo é conservar a nossa casa comum, assegurando prosperidade para as próximas gerações.

  • Fontes:

Dia Nacional da Conservação do Solo – Embrapa​ embrapa.br;

FAO – Status of the World’s Soil Resources​ ige.unicamp.br;

MapBiomas Solo – Coleção 2 (Carbono Orgânico e Textura)​ brasil.mapbiomas.org;

LabPED Unicamp – Blog de Pedologia ige.unicamp.br/pedologia/blog/​;

Biowish/FAO – Biodiversidade do Solo​ biowishtechnologies.com;

Rede AgroPesquisa PR – Sistema FAEP​ sistemafaep.org.br;

Embrapa – Manejo Conservacionista (Plantio Direto)​ atermaisdigital.cnptia.embrapa.br;

Rizoma/Regeneração do Solo​ rizoma-agro.com.br .

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